segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Reboot



Não sei do que quero escrever
Nem do que estou a escrever neste momento
Faço apenas parte de um veículo
Tão extenso e frágil..

Apetece-me mergulhar de cabeça
Na terra volátil...
Sucumbir nela como caveiras secas no deserto
Ser leve como um grão de areia.

Agradeço depois se o triunfo vier
Na metamorfose, essa sim, que nunca mais chega ao fim...
Pois há dias em que não nasço sequer
Perduro ali rendido... Coleccionando emoções, pensamentos. (Embriagado)

E ninguém me força, ninguém me agarra na mão,
Houve alguém que me renasceu pela alma
Livrou-a do peso que todos carregam
Fixou-me em mim como uma paisagem na tela.

De que vale construir casas abandonadas,
Se elas não suportam o frio dos castiçais apagados?

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Acorda-me


Da inexperiência à loucura
Por caminhos verdes se prolonga a estirpe
Há quem diga que os sonhos se revestem de nuvens
E a alma se mascara de demónio.

Quando os anjos perfuram os sonhos
E as grinaldas das histórias se empoleiram
Na mágica sucessão de cores vibrantes,
O ocaso vem de novo celebrar os caminhos cegos.

O medo espraia-se nos caminhantes luminosos do céu
Que salpicam o espaço de corpos assombrosos
Começa o estrelato a mover-se nas galáxias
Tão redundante quanto a espuma das marés envolventes.

Nisto chega o tempo, e tudo recomeça da forma mais suja
Tudo se faz num castigo, numa lei.
Até as metamorfoses são menos raras...
E o leito dos rios é mais pobre que duas pétalas queimadas.

Chamam de vida o que nos mata todos os dias
E eu só a sei celebrar quando me despeito
A corromper qualquer desses castigos,
Onde o menos óbvio prevalece ao sorriso de um novo amanhecer.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

O mal


Um dia és feliz, corres para a novidade,
Foges da seca adega de tumultos
Que tantas vezes foi palco
Das tuas miseráveis encenações lamuriantes.

És intocável,
Porque já nada se espeta
Nesse teu coração apagado
De tanto lhe terem provocado.

Pesa-te o corpo, o vómito vem sem ser convidado
E a culpa indistinguível
Torna-se na tua ânsia
Em tornar todo o sentimento invisível.

E tudo se faz num piscar de olhos
Quando já to tentaram reconstruir
E de tanto medo de to apagarem de novo
Levas a tua avante, seco e desvario, nulo de tão céptico.

Só adorava poder voltar a sentir que nunca exististe.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Solidão



É preciso o maior dos testemunhos
De todos esses textos moribundos
Tão obcecadamente pincelados de negro
E dos esguichos provocados pelos que pensam escrever por gosto.

Não se sabe onde tudo começou
Mas é o único inimigo da vida
Esse atendedor da morte
Que perfaz tão bonita palavra e tão forte ditongo.

Falo dos que em tempo e lugar não se entendem
E dos que a morte é por si já a maior das virtudes
Estes gestos que permitem o desabrochar de inócuas inocências
Deixam a imaginação descer do céu como uma semente de Deus.

E agora esse pequeno botão floresce
E torna-se na mais tímida concepção da eterna paisagem
O sopro dos sóis esmiúçam o seu talento
A quem declaram guerra!

E eu, o meu casulo, enrolado nas pálpebras dos anjos
Segrego aos demónios a minha veneração,
Ajoelham-se perante tal audácia e recolhem as lágrimas dos meus protectores sagrados,
Que nunca virão nada senão a luz do eterno incandescente.

O mundo todo conspira na alegria, na folia e nos afectos
Mas só eu me sei amar
Só eu contemplo a minha alegria estendida pelos cantos do universo
E quem lhe chama solidão não sabe o que é a vida!

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Velvet night flight


Emergiam do mundo, dessa carcaça...
Ratos? Musaranhos? Que estranha raça!
Derrubam o chão onde a gente passa
E embora eu não saiba mais o que faça
Corre o ciclo da inquietante desgraça.

Chamar-lhes-ia toupeiras gigantes
Isto se não fossem do tamanho de térmitas pedantes
Gostaria de fazer um poema em sua honra
Se não fosse a construção da nova Gomorra
Que não me deixa concentrar e criar...

Roubam a hostilidade dos meus versos
Trocam-na por capitais, cenas de excesso!
E eu fico agarrado ao meu nome encravado,
A rezar por um mundo que não seja cavado.
E me dê um bruto prazer nesta vindoura ameaça.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

O sinesteta


Todos os dias nos confrontam sensações diferentes.
Nem que declarando guerra aos sentidos,
É possível reaver os sabores do ontem
Nem os dissabores do amanhã nos ocorrerão.

O que faz a procura no presente mais intensa,
Sedutora e realista. Plena de vida.
As irrecusáveis tentações esboçam-se em fumos
Que elevam os frutos à sua posição original.

As luzes sobem dos tectos ao céu
E a entropia querida dos arredores
Esgota-se nas cidades insaciáveis
Não só por meras sensações, por desilusões.

São doces os fumos deste sitio
Carnudos os tons do lugar e sangrentas as texturas!
Tudo ao som octodecadente.

Preferia estar a ouvir a agonia de qualquer alguém a nascer.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Neutrão


De tudo o que Deus criou e possui existe algo que lhe dilacera a própria existência: o neutro.

A razão seria apenas a de se combater a si próprio visto tudo tender para uma entropia generalizada que culmina em colapsos ditos eles, feitos de Deus. Ora se um Deus é capaz de gerar um Big Bang porque não é ele capaz de o dissolver e de o devolver ao seu estado mais pleno? Deus só sabe agitar o universo porque quando tudo assenta já nada faz parte da sua obra. A consequencia não é culpa do criador, porque a criação tem vontade própria e tem identidade e acaba sempre por derrotar o seu criador por mais forte que este seja. Sendo assim Deus beneficia de certas cláusulas existencias importantes: a primeira, a paridade da heterogenia que presenciamos em tudo o que sentimos, positivo e negativo. A segunda é ela mesma descendente da primeira mas não propriamente consequente: o neutro.

O positivo e negativo foram criados, e durante algum tempo, tudo fluiu, cresceu e não permaneceu inerte. Tal como qualquer criador, Deus agita a consciencia mas não a dilui, sendo que a primeira vaga de criação estava completa assim que se estabeleceram as relações extremistas entre positivo e negativo. Daí advem todos os outros opostos conhecidos até hoje nunca esquecidos no tempo.

Deus contava ainda com a anulação da criação, sendo que poderia essa ser ou não adviente da sua obra, daí ter resultado o neutro. Poderia Deus saber que a sua obra só estaria completa assim que desenhada e construida a sua anti-obra? Não. Apesar da omnisciencia existe também a ideia da imortalidade e em quem mais depositar o maior atributo que alguma vez teve senão na sua própria criação? O neutro foi posto de lado e Deus continuou a estabelecer a primeira cláusula como principal, ignorando a algum custo os lados que se querem unir e destruir a sua criação.

Sendo que o neutro ficaria de lado, não tardou a que os próprios opostos se aproximassem e se unissem num modo que o Omnisciente nunca pensara.

A destruição de Deus deu-se cedo. A criação revoltou-se contra o que este tinha ignorado e o positivo e o negativo tendem sempre para o neutro passando um novo Deus mais poderoso a existir.

Deus é a causa primeira de todas a coisas, no entanto, a sua destruição é consequencia e resultado da sua própria criação.